Uma nova modalidade de licitação aprovada pela Assembleia Legislativa nesta semana pode ‘sucatear’ os procedimentos de contratação do poder público em Mato Grosso, na avaliação de especialista. O projeto de Lei 542/2017, aprovado em segunda votação, inverte as fases de licitação, avaliando primeiro o preço e depois a habilitação das empresas concorrentes.
Advogado e especialista em licitação, Jorge Ulisses Jacoby Fernandes acredita que o artigo 11 da lei aprovada pode prejudicar a execução de serviços de natureza extremamente técnica, quando a habilitação dos concorrentes deve ser essencial. ‘Me preocupa que o Estado passe a licitar obras com alguma complexidade técnica, sob pena de nós sucatearmos a inteligência de projetos’.
A lei de inversão de fases, que prioriza o preço em detrimento da habilitação, poderá ser adotada inclusive nas obras paralisadas da Copa do Mundo de 2014.
A ideia é constitucional e já existem leis semelhantes em estados como Goiás, Bahia, Paraná e São Paulo.
A lei do pregão, usada para determinados contratos, por exemplo, já prevê esse tipo de ordenamento, mas excetua as obras e projetos complexos. Nestes casos, a licitação deve seguir as regras da Lei 8.666, de 1993.
“Na inversão de fases, você torna a licitação mais rápida porque você só analisa o documento do vencedor”, explicou Jacoby. “Na lei 8.666 todo mundo tem que estar habilitado para competir, se separa o joio do trigo”, concluiu.
Em casos em que o vencedor no quesito preço acaba inabilitado na parte técnica, o segundo colocado no processo é que deve substituí-lo. O problema, conforme Jacoby, é que, em muitos casos, vários dos melhores colocados tecnicamente não conseguirão ser habilitados quando analisados os valores cobrados por eles. Além disso, em casos de inabilitação do vencedor no quesito preço, o pregoeiro ou responsável pela licitação precisará ter ‘coragem’ para dar como vencedor um concorrente cujo valor cobrado pode ser milhares de reais mais caro que o primeiro colocado.
“A grande vantagem da inversão é a celeridade e, com certeza, o menor preço. A desvantagem é porque há competição entre o joio e o trigo. Alguém pode formar uma empresa rapidamente e competir no preço e só mais tarde ele pode ser inabilitado, mas isso vai afugentar outros concorrentes, que não conseguem oferecer o mesmo preço que o concorrente aventureiro”, avalia o advogado.
Licitações “alternativas” não são novidades em Mato Grosso. O Estado foi o primeiro a usar o Regime Diferenciado de Contratação (RDC), depois da liberação do procedimento pelo Supremo Tribunal Federal (STF). As obras do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) também devem ser novamente licitadas por RDC.
O deputado estadual Wilson Santos (PSDB) é um dos defensores do projeto. Em entrevista por telefone, ele desconversou sobre a possibilidade de a lei recém aprovada legalizar a inversão de fases de forma irrestrita, incluindo projetos e obras complexas. A norma, segundo ele, põe fim a algumas burocracias da Lei 8.666, que ele considera ‘superada’ em alguns aspectos.
“Depois do advento do RDC, o legislador federal, estadual e municipal anda a procura de destravar e de desburocratizar, fazer com que as coisas andem. Estou acabando de sair de uma experiência executiva de um ano e meio [como titular da Secretaria de Estado de Cidades] e posso dizer que está cada vez mais difícil ser gestor neste país”, comentou.
Crédito: Gazeta Digital